terça-feira, 9 de junho de 2020

SEM VELÓRIO E SEM CORTEJO

De Sansão e Pletilda a falta de velórios e cortejos para despedida dos mortos. A vida sem happy end.



Há um mês perdemos dois companheirinhos queridos, o Sansão e a Pletilda. Um seguido do outro com a diferença de apenas uma semana. Tive vontade de escrever sobre eles e sobre a perda, mas entendi então que seria um certo egoísmo de minha parte ocupar meus escassos leitores com assunto tão simplório, enquanto outros enfrentavam problemas muito maiores com perdas de ente queridos, homens, mulheres, jovens e crianças que deixam a saudade          eterna para  pais, avós, tios, irmãos, amigos e outros.  Mas hoje, ao deparar  carros funerários a caminho do Cemitério Santo Antônio, o famoso Tonhão, percebi que a morte está banalizada. Pessoas queridas se vão e não há quem faça um cortejo, quem lamente a sua partida, não porque as pessoas não desejem fazer isso, mas porque estão impedidas por causa da pandemia do Covid-19.
Estamos em guerra e assim, cada um recolha seus mortos. Os lamentos estão sendo feitos entre quatro paredes, como reza a lei do isolamento social. Situação triste, muito triste mesmo.                                                                Quando criança, morando em um bairro dormitório, aonde os moradores adultos só iam para dormir, porque trabalhavam em  locais distantes e pra completar tinha uma certa escassez no transporte coletivo, dificilmente morria uma pessoa no bairro. E se morresse alguém, virava um acontecimento, vinha gente de todo o lugar para dar condolências à família enlutada e aproveitava-se para rever os amigos, alguns distantes há anos. Em geral era preciso alugar um ônibus para levar tanta gente ao cemitério. Todos queriam ir, queriam a última despedida.  
Um dia desses uma amiga estava triste com a morte de um sobrinho de 18 anos em Fortaleza. A princípio, o menino morreu de Covid-19. Ao sepultamento compareceram a mãe e um outro familiar, cada um transportado por um motorista de aplicativo. Urna selada, sem pranteadores assim o moço foi enterrado. Duas semanas depois vem o resultado do exame médico atestando que a causa morte não foi o  corona. Imagina a dor da família? A saudade     dos amigos?
Fico imaginando como será nosso relacionamento com a morte pós coronavírus.

Sansão
Por Falar em Cachorros
Mas falando da Pletilda e do Sansão, eram ainda jovens, ele       cinco anos e ela quatro. Em plena pandemia do Covid-19 foram infectados com o vírus da cinomose. Um sofrimento para eles e para nós. Tivemos que apelar para a eutanásia. E pensar que poderíamos ter evitado ou amenizado tanta dor com uma simples prevenção, ou seja aplicando a vacina neles. Mas agora é tarde, não adianta mais lamentar, só guardar no peito a saudade que eles deixaram e lembrar de quanta falta eles fazem. O Sansão um manhoso inveterado. Dava umas uivadas muito loucas no quintal, especialmente à noite. Meus vizinhos me diziam que ele chorava muito quando eu viajava. Quando eu chegava era aquela festa. O Sansão  nos foi dado como premio de consolação.  Nossa amiga Benedita Nery tinha em casa dois cães, a  Dandara, uma pitbull com labrador e o Thollo, um pitbull puro. Eram ainda jovens, estavam na segunda cria.  Encantadas com a beleza de uma filhotinha acabamos recebendo-a como presente. Ainda estávamos descobrindo o nome da criaturinha quando a pobrezinha  desapareceu, escapou pela abertura inferior do portão e se foi. Era muito linda mesmo. Penso que alguém a levou. Benedita ainda tinha outro filhote e resolveu nos dá. Foi uma benção. Apesar de nosso olhar não ter sido      primeiro para ele, Sansão nos surpreendeu. Ganhou este nome porque era forte, parrudo, todo saradão, mesmo sendo um   bebê. Extremamente carinhoso. Lembro-me que no dia em que o levei para a castração, o jovem atendente do local lamentou profundamente pela sorte do cachorro e tentou até interceder para que eu não fizesse aquilo. Não deu certo, ele não conseguiu mudar minha opinião. Em casa já tínhamos uma cadela, a Evita e não daria certo a procriação. 

Pletilda
Depois veio a Pletilda, que também não foi escolhida. Um dia visitei uma pessoa doente e vi a cadela com duas filhotes. Achei bonitinhas. Dias depois a Cabiria, dona das cadelas me ligou implorando para ficar com pelo menos um dos animais, porque a proprietária do imóvel havia determinado que ele desse fim nos cachorros ou arranjasse outro lugar pra morar. Ficamos  com uma das filhotes, que recebeu o nome de Pletilda. Mais tarde, novamente acionada pela senhora que pedia socorro, conseguimos um lar para a mãe da filhotinha. Seu nome é Dandara e está muito bem obrigada, mora aqui na minha rua na casa da Selma que a aceitou de bom grado depois de saber que estava condenada a uma vida sem casa.
Pletilda era a que mais latia no quintal. Muito, muito barulhenta mesmo. Às vezes eu tinha que levantar de madrugada e mandá-la calar-se. Ela gostava de me espionar pela janela do quarto. Vira e mexe ela aparecia para dar uma olhada. Acho que para saber se estava tudo bem. Era a mais tímida e recatada de todos. Tarde da noite quando os soltava para dar uma voltinha na rua, ela era a primeira a retornar. Agora o quintal está silencioso, quase vazio, não fosse a presença da Evita e da   Meggie. Evita que era a líder, agora  está triste porque não tem mais a quem liderar.                                        
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Meggie
 
Evita








  


quarta-feira, 29 de abril de 2020

COVID-19, UM MAL QUE NÃO DESEJO A NINGUÉM





Um plantão inesquecível 



A princípio, aquele parecia ser só mais um plantão. Mas ao chegar ao setor de trabalho percebi uma certa tensão. A equipe que estava saindo estava preocupada e a que estava entrando estava apreensiva. O motivo era um paciente de meia idade que fora levado à clínica para um determinado procedimento, mas havia a suspeita de que ele fosse um dos primeiros infectados pelo Covid-19 a  dar entrada no hospital. Intimamente pedi a Deus proteção para todos nós e a cura para o paciente.

A verdade é que a enfermidade se instala primeiro na mente. Plantão de correria, pacientes graves e precisando da nossa atenção, medica um, socorre o outro e assim foram as primeiras horas. Mas lá no fundo do coração estava a preocupação: vou ser infectada pelo Coronavírus? Afinal, todos hão de convir que nossa preocupação fazia todo sentido. Todos os dias recebíamos notícias sobre a morte de profissionais da saúde, homens e mulheres jovens e cheios de sonhos,  alguns estavam entubados nas  UTIs.  Triste mesmo, porque nem um funeral honroso se pode ter nestes tempos.

Os dias se passaram e a doença, segundo médicos, pode levar até sete ou oito dias para se manifestar. E passado este período comecei a sentir todos os sintomas. Tentava me convencer: é só uma gripe, vou sarar logo. E os plantões continuavam. Até que não aguentei mais. Entreguei os pontos e adoeci de verdade. Passei um  dia com o celular na mão ligando para todos os números disponíveis e parecia mais fácil falar com a rainha da Inglaterra, com todo o respeito que ela merece, do que com os atendentes dos telefones listados pelos governos. Até que consegui um “alô” do outro lado da linha. Contei minha estória, os sintomas e tudo que ouvi foi um “fique em casa, ligue novamente se sentir falta de ar”. Senti um misto de decepção, desânimo e desespero. Mas fazer o quê, além de recorrer ao Todo Poderoso Deus dos Céus e Senhor dos senhores.

A noite foi das piores. Cansaço, angustia e sem saber o que fazer. No dia seguinte fui informada que não adiantava buscar socorro no pronto atendimento, sem antes ser ouvida pelo serviço de encaminhamento, que após alguns procedimentos me mandaria para  alguma unidade de saúde  Então teria que fazer a mesma via crucis  do dia anterior. Isso para ser vista por um médico. A bem da verdade, eu já tinha a solicitação de um médico para o teste do coronavírus, mas não consegui fazê-lo, a não ser que eu fosse em busca de um atendimento particular, mas ai já era demais. Tudo indicava que eu tinha sido infectada no ambiente de trabalho, ou seja: dentro do hospital e ainda teria que pagar pelo exame? Pior de tudo é que eu não dispunha do recurso e por incrível que pareça, não fosse a solidariedade de alguns amigos não teria feito o teste, que deu a sentença: POSITIVO.

Mas Deus é realmente extraordinário e a aflição das primeiras horas foram substituídas pela esperança trazida por dezenas de pessoas que ligavam, enviavam mensagens e diziam: “estamos em oração por você”.

Veio o isolamento. Que sensação triste e dolorosa saber que ninguém pode ir vê-lo e você não pode sair para ver ninguém. Em casa só eu e o marido. Ele também apresentava sintomas, mas não conseguimos o teste. Tomamos as precauções recomendadas, mas permanecemos em convivência em casa. A doença estacionou e aos poucos foi regredindo, já não sentia mais o desconforto dos primeiros dias. O que doía mesmo era a solidão, apesar de sermos dois em casa. Às vezes ficava imaginando como se sentiam aquelas pessoas contaminadas pela lepra que a bíblia tão bem relata. Viver separado por opção é uma coisa, mas por obrigação é bem diferente. 

Enquanto me recupero, não me canso de agradecer a Deus pela sua ação. Sei que muitos profissionais de saúde estão passando por uma situação muito difícil e alguns sem esperança, entre eles colegas de trabalho. Não sei se este vírus foi fabricado em laboratório, mas sei que quando Deus age o homem cai por terra. Ainda não estou cem por cento recuperada, mas creio que isso é uma questão de dias. 

Não vejo a hora de receber meus filhos e netos em casa, abraçá-los bem apertado e sussurrar em seus ouvidos um “eu te amo” bem pausado.  De abraçar os meus amigos e agradecer olhando nos seus olhos. Aprendi muito com o Covid-19 e quero ser uma pessoa melhor, muito melhor mesmo. Quanto àquele paciente, nunca fiquei sabendo se ele estava mesmo infectado, mas tudo indica que sim. Espero que ele tenha se recuperado.                                                                                                                                                            (Crônica baseada nos relatos de um paciente infectado pelo Coronavírus-19).
                     

quarta-feira, 18 de março de 2020

COVID 19


Novo Coronavírus ou Covid 19

 “No final do ano de 2019, já no mês de dezembro apareceu lá pela Ásia, mais precisamente na poderosa e populosa China um vírus, que a princípio parecia ser mais um de tantos outros registrados naquele país até então. Seu nome: Novo Coronavírus ou Covid 19. Então, se era o Novo, já existira outros antes.

Wuhan, uma metrópole com 11 milhões de habitantes, localizada no centro da China surgiu como o epicentro do 2019-nCoV,    e logo nos primeiros dias infectou cerca de 400 pessoas, atestaram as autoridades sanitárias. Depois os números foram crescentes e menos de três meses depois chegou a casa dos 170 mil infectados e pelo menos 6.850 mortos e a doença espalhou-se por 140 países.”

Este talvez seja um texto a ser  escrito daqui há alguns anos. E quem ler não vai sentir a apreensão que nós estamos sentindo hoje. Talvez como nossos ente queridos que viveram a gripe espanhola, ou um pouco mais atrás a peste negra.  Os dados certamente serão importantes para estudos, mas nenhuma ameaça para as gerações futuras.
Habitante de Porto Velho, um pedacinho de chão da Amazônia com pouco mais de meio milhão de habitantes, estou a pensar com meus botões se haverá solução para nós cidadãos que vivemos tão distante dos grandes centros, onde os recursos sanitários e de saúde ainda são precários, se teremos chance de sobreviver a um ataque de fúria do Covid 19. Ai alguém me diz: e nos grandes centros todos estão sendo atendidos? Não sei. Vivemos em um mundo moderno, onde as informações continuam muito tendenciosas. Não dá para saber com segurança em quem acreditar de verdade. Rádios, jornais, TVs e sites repetem o que dizem autoridades, algumas com uma ou outra interpretação. Quanto às autoridades, estas dizem aquilo que é conveniente dizer no momento.
Acho mesmo é que estamos em um mato sem cachorro. E melhor mesmo é a prevenção. Amigos e familiares, agora só online. Cultos e missas também online. Trabalho?  Eu já trabalho em casa faz tempo. Quem chega de viagem tem que aguardar em quarentena por pelo menos sete dias, mesmo eu não tenha sintomas. Mas ainda assim tem gente que não está atendendo a orientação. O que é lamentável, pois põe em risco a vida dos demais.
Li ou ouvi depoimentos de pessoas que estão na Itália e é de cortar o coração. Uma amiga de Treviso conta que só sai  para o supermercado uma vez por semana. Toda a família está confinada no apartamento.  Em outros depoimentos, duas brasileiras moradoras da região da Lombardia, onde o Corona está comandando a vida de todos, relataram aos amigos por meio do whatsapp, a situação sofrida e que têm vivido em  isolamento, com desabastecimento e até humilhação.
Padre Enzzo, um sacerdote que atuou em Porto Velho por cerca de 30 anos, também está na Itália onde e deu um depoimento para os amigos que cuidam da Associação São Thiago Maior, aqui na cidade, contando sobre os acontecimentos e pedindo ação dos governantes brasileiros. O religioso confirmou que protocolos médicos e hospitalares dão preferencia ao atendimento de pacientes mais jovens, em detrimento dos idosos.  Adeus prioridade para maiores de 60, 70 ou 80.
Para terminar o assunto, devo dizer que fui  ao shopping hoje, não a passeio, mas para resolver uma situação. Na entrada, antes da abertura era sempre uma muvuca de gente aglomerada esperando dar dez horas. Hoje, o que vi foram poucas pessoas e ninguém amontoado na porta principal junto ao segurança.
No interior do shopping quase um silêncio total. Lembrava até uma catedral.


Shopping de Porto Velho hoje pela manhã, movimento pequeno para início do expediente




sexta-feira, 6 de março de 2020

RECEITA LEGÍVEL, DEFENDA ESTA IDEIA



Receitas ilegíveis divulgadas na Internet

Quando uma receita pode causar danos e confusão

Sabe aquela     receita médica que você apresenta no balcão da farmácia e um vendedor fica pedindo ao outro colega para decifrar? Pois é, por lei isso não pode acontecer, porque o médico, dentista ou qualquer outro profissional habilitado para prescrever um medicamento para qualquer paciente tem que escrever o nome do remédio ou substância com toda clareza, de preferência em letra de forma, datilografado – o que não é mais o caso nos  Centros de médio e grande porte -  ou digitado eletronicamente.
O assunto parece bobo, mas é muito sério. Tanto que tem há leis para regulamentá-lo desde 1932. Mas ao que parece ainda há muitos profissionais da área de saúde usando seus próprios hieróglifos na hora de prescrever o medicamento. A má escrita nas receitas médicas foi tema de uma audiência pública realizada na Câmara de Vereadores de Porto Velho, proposta pelo  vereador Da Silva do Sinttrar e da qual participaram alguns farmacêuticos.
Regra geral uma receita não deveria suscitar dúvidas ou questionamentos, uma vez que o profissional que a prescreveu esteve face a face com o paciente, fez os questionamentos e exames de praxe, mas na hora da transcrição do nome no papel usou garranchos de tal forma que inviabilizaram o entendimento do nome do medicamento. Ele pode até ter dito o nome da solução ao paciente, mas é difícil guardar os detalhes do que diz um médico numa consulta médica, por menor que seja o problema tratado. E ai o dilema quando chega na farmácia e nem o vendedor e nem o farmacêutico de plantão consegue decifrar o enigma. Os profissionais de farmácia são orientados a não fornecer o medicamento quando há falta de clareza, para não por em risco a vida do paciente e ai só resta mesmo mandar o paciente de volta ao médico para que este refaça a receita, mas todos sabemos que isso nem sempre é possível e neste caso, muitas vezes o paciente acaba desistindo do tratamento ou passa para uma alternativa sem a receita médica, o que de certa forma também o põe em risco.
A proposta da audiência pública é a de promover uma fiscalização mais  intensa, a partir das unidades municipais, como Upas e postos de saúde, para que estes setores coloquem a disposição dos médicos recursos eletrônicos – computadores e impressoras – para emissão das receitas, de forma a não deixar dúvida.  A prática já é corrente em alguns hospitais, mas deverá tornar-se comum em todas as unidades de saúde, quer do setor público ou privado. O projeto Receita Legal é Receita Legível  original é do Conselho Federal de Farmácia, apoiado pelo Conselho Regional de Rondônia e agora também por vereadores de Porto Velho.  Quando a receita é legível ela nos dá segurança e isso é muito importante. 
Vereador Da Silva e farmacêuticos em audiência pública na CMPV

 

quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

AS IDOSAS DA MINHA VIDA

Parte da minha infância e adolescência foi vivida ao lado de pessoas mais velhas, aliás, bem mais velhas. Esta semana comecei a lembrar delas e resolvi registrar essa  parte da minha vida aqui no blog. E fico imaginando se eu, hoje com 60 anos, tenho influenciado crianças e adolescentes, talvez até jovens para o bem. Sim, porque com simplicidade as mulheres aqui mencionadas foram exemplos fantásticos para a minha vida. Possivelmente naquela época eu nem me desse conta disso. 

Irmã Ana

Quando era adolescente tive a oportunidade de conviver com uma senhora que nasceu em 1907. O nome dela era Ana dos Santos, tia do marido de minha irmã, Lucas dos Santos. Naquele tempo ela já era bem idosa, mas tinha uma firmeza de poucos. Nós, os vizinhos, a chamávamos de ir. Ana. Ela era costureira fazia shortes e calcinhas de tecido usando aquelas máquinas de pedal, mas sua especialidade eram as colchas de retalhos. Cantava no Coral da  Assembléia de Deus do Parque Império e tinha uma vitalidade fora de série. Ia a igreja pelo menos três vezds por semana e para chegar lá caminhava talvez uns quatro quilômetros de ida e outro tanto de volta. Ela me ensinou a fazer arroz, quando minha mãe foi hospitalizada e eu tive que ir pro fogão cozinhar pra família. Na ocasião eu tinha uns nove anos.  Não me lembro de ouvir ir. Ana reclamar de uma dor na unha que fosse. Se a pressão era alta, não sabia, se tinha diábetes, eu creio que não, também desconhecia. Neste período ela estava mais ou menos com 65 anos. Depois de algum tempo ela foi morar com a filha, ainda visitei algumas vezes e ela continuava muito autônoma, morando no espacinho dela. Faleceu perto dos 105 anos, ai já não tinha mais muito contato. Mas foi uma mulher resistente ao tempo e às dificuldades da vida. No linguajar de hoje eu diria que era uma pessoa com muita resiliência. 

Irmã Alice

Também conheci uma outra senhora, um pouco mais jovem, que em 2020 completará 101 anos. Com esta não tive uma convivência tão próxima, mas é também uma mulher muito forte e resistente. Enviuvou muito cedo e pra completar a pensão deixada pelo marido também trabalhava como costureira. Recentemente estive com ela e demos boas gargalhadas quando ela me contou que eu queria aconselhá-la sobre a vida sentimental da filha. A moça gostava de um rapaz e ela não queria o relacionamento e eu vivia a dizer pra ela deixar os dois namorarem e que ela não tinha nada que interferir. Pensa se tem lucidez? Ela venceu, porque apesar no namoro ter acontecido, não deu certo e a moça casou-se com outro. Mas o legal mesmo é que ela se chama Alice como eu. E para os 100 anos está muito bem, apesar de alguns percalços causados pelo tempo. Em abril, se Deus quiser ser´hora de virar a folhinha para 101. Deus a abençoe ir. Alice, mantendo a sua lucidez.

Esta é a ir. Alice no auge dos seu centenário (foto atual)
Irmã  Emília

Outra idosa que teve influência na minha vida foi a Emília. Nunca soube a idade exata dela. Esta não era sozinha, tinha um marido, mas penso que seria mais feliz se não o tivesse. Definitivamente ele não era um cara legal. Mas quando ele faleceu aos 76 anos, ela sofreu muito e sua vida não foi mais a mesma.  Pois é, ir. Emília também era evangélica e foi responsável pela conversão de minha mãe. Na verdade, acho que ela era a melhor amiga de minha mãe. Não conversava comigo como a irmã Ana, mas me tratava bem e quando era preciso até me alimentava. Aplicava as injeções mais doidas da minha vida, uma tal de Ozonil Infantil.  Quando o líquido entrava na carne saia rasgando, pra ajudar eela também tinha uma mão bem pesada. Tinha prática, mas  sempre ficava nervosa. Naquele tempo as seringas eram ferventadas. Ela tinha o kit. A gente só tinha mesmo que comprar as agulhas. Meu irmão mais novo, o Ananias, sofria mais, porque ele tinha bronquite e vivia tomando aquela coisa. Eu era só quando ficava gripada. Quem receitava? Minha mãe mesmo, ou o seu Eri da Farmácia, porque nós não íamos ao médico. Mas era o melhor que tínhamos e agradeço a Deus pelas agulhadas.  Eu prestava serviços para a ir. Emília. Areava suas panelas de vez em quando, com palha de aço, nesse tempo a prática de arear com areia já tinha ficado para trás, ainda bem. Acho que ela não tinha muita força nas maõs e braços e as panelas de alumínio eram todas embaçadas (sem brilho). E eu  as deixava como espelho. Também ia na peixaria para comprar peixe, lá na casa dela comiam mais peixe que carne. Os favoritos eram xaréu e xarelete, às vezes ela pedia uma tainha e dificilmente  comprava sardinha. Também comprava gás pra ela. Morávamos mais ou menos próximo a duas ou três envasilhadoras de gás de cozinha. Não, não era trabalho escravo, sempre tinha uma recompensa, nem que fosse o troco da compra. Ela também fazia deliciosas cocadas e eu vendia e comia, é claro. Irmã Emília tinha uma preocupação enorme conosco e era a nossa maior dedo duro. Se meus irmãos ou eu pisássemos na bola, e ela soubesse, não tinha dúvidas, corria e contava tudo pra minha mãe. Mas era visando o nosso bem. Ao que me parece  nunca teve filhos. Socorreu a nossa família nas horas da necessidade e olha que não foram poucas. Uma mulher destemida, uma seguidora de Cristo incontestável. Faleceu aos 84 anos e assim como  a irmã Ana, também fazia colchas de retalhos. Muitas vezes fui com ela em um lixão onde a Demillus despejava restos de material para pegar retalhos, com estes ela produzia tapetes, que eu mesma ajudava  a vender na vizinhança.

No centro ir. Emília, um registro para mim inédito, junto com Aldecira e D. Anna, minha mãe
Irmã Arinda

Tem outras pessoas, mas acho que não dá para falar de todas. Vou fazer aqui uma pequena anotação sobre a irmã Arinda. Não sei quase nada sobre ela. Era amiga da irmã Emília e também fez amizade com a minha mãe. Morava distante e aparecia raramente onde vivíamos, congregava na principal Assembleia de Deus de Duque de Caxias de então. A famosa igreja do pastor Libório. Já era uma senhora e tocava um instrumento de sopro, talvez flauta ou clarinete. Nunca a vi em ação, mas era desde então apaixonada  pelo som que nem sabia distinguir, mas quando ela falava era especial e talvez desde aquela ocasião sonhasse em tocar um instrumento de sopro, o que só se concretizou uns 20 anos depois. Dela não tenho nada, a não ser a doce lembrança de uma mulher negra, com muitos filhos, alguns trabalhosos, como ela evidenciava nas conversas entre adultos que eu,  às vezes ouvia e talvez a expressão da sua maior alegria que era tanger seu instrumento louvando ao Mestre Jesus. 

quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

MUDANÇAS NA LEI PREVÊ ELEVAÇÃO DE IDADE DE 60 PARA 65 ANOS PARA IDOSO



                         Estatuto pode sofrer alteração e impor um novo limite para se tornar idoso no Brasil e como ficam os benefícios de quem já é sexagenário?

Uma mudança no Estatuto do Idoso  e na Lei 10048/2000, que trata     da prioridade de atendimento aos idosos poderá retirar benefícios de milhares de idosos com idade inferior a 65 anos. O Projeto de Lei 5383/19 está tramitando na Câmara Federal nas comissões de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa e de Constituição e Justiça.
Se aprovado, o brasileiro só será considerado idoso ao completar 65 anos e não mais 60, como prevê o Estatuto, perdendo privilégios simples, como tratamento prioritário e gratuidade no transporte coletivo, atendimento diferenciado em bancos, repartições públicas e empresas concessionárias de serviços públicos, bem como a prioridade na tramitação de processos e procedimentos e na execução dos atos de diligências judiciais em que conste como parte.
A  proposta é de autoria do deputado João Campos do Republicanos de Goiás, cuja alegação é de que o brasileiro está vivendo mais e com expectativa de vida de 80 anos para as mulheres e 73 para os homens. Além do que as pessoas estão chegando aos 60 anos com qualidade de vida, em plena atividade laboral, intelectual e física.
A aposentada Maria Raimunda de Lima, de 76 anos entende que a classe menos favorecida envelhece precocemente e aguarda os benefícios adquiridos a partir dos   60 anos, “como esperar mais cinco anos?”, pondera.


Maria Antônia tem 81 anos, é professora aposentada desde 1992 e diz que a idade do idoso deve ser contada mesmo a partir dos 65 anos, como aponta o projeto de lei do deputado.


Eu acabei de fazer 60 anos e não acho justo  a cassação dos  direitos das pessoas com mais de 60, até porque, nem todo mundo tem a mesma condição física. Um trabalhador braçal, seja homem ou mulher, não chega aos 60 com a mesma disposição de um bancário, por exemplo. Além disso, são os menos favorecidos que precisam dos benefícios como a gratuidade no transporte coletivo, seja ele urbano, intermunicipal ou interestadual. Sem contar, que são estes mesmos que vão para as filas dos bancos e casas lotéricas porque os de melhores condições pagam suas contas através de aplicativos online.

Será que um trabalhador destes conseguirá usufluir dos benefícios do idoso aos 65 anos?
Uns três anos antes de completar 60, fui surpreendida por uma atendente de banco que perguntou se a minha senha era preferencial. Na época tive um sentimento misto. Estava tão derrubada   pra uma jovenzinha estagiária achar que eu tinha uma idade bem além da minha? Depois aconteceram outras vezes, mas já não me chateei tanto. Às vésperas de completar 59 ganhei o direito a meia entrada no Museu de Artes Plásticas do Rio de Janeiro. Não adiantou falar pra moça que só faria 60 no ano seguinte. Recentemente no desembarque de voos internacionais do Aeroporto  de Guarulhos, ter 60 de verdade me economizou uns 20 minutos de espera, porque a fila de quem tinha prioridade era muito menor. E aos poucos a gente vai se acostumando com a idade sexy. Logo vou providenciar o cartão de estacionamento e a carteira que dá direito a passagens gratuitas para outros estados. Dizem por ai, que não é muito fácil conseguir uma vaga, mas nada pra quem dispõe de um pouquinho de tempo. 
 O negócio então é aguardar. 

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

OFICINA DE ARTES LEVA RITA QUEIROZ À ZONA LESTE

O tempo passa, mas ela não pára. Aceitou o desafio e foi ensinar pintura em tela para moradores da Zona Leste em Porto Velho. 
Alunos do curso de pintura em tela
Orientar alunos em uma oficina de pintura durante uma semana na Zona Leste de Porto Velho, este foi o mais recente desafio superado  pela artista plástica Rita Queiroz. Ela, que foi convidada para ensinar técnicas básicas  de pintura para moradores de um condomínio do projeto Minha Casa Minha Vida no bairro Socialista, na zona Leste de Porto Velho, considerada como a região mais violenta da capital,  ficou impressionada com o interesse da turma.  
Mas esta nobreza é própria de Rita, que há alguns anos atuou voluntariamente em Porto Velho ensinando crianças  oriundas de famílias  de baixa renda técnicas de pintura em tela, um trabalho que rendeu muitos frutos ao município que realizou então várias exposições e comercialização de muitas telas, algumas delas foram parar na Itália, como destacou na página do Facebook da artista, a técnica Selma Mazieiro, que na época atuava no projeto representando o município. 

A facilidade da jovem Beatriz surpreendeu Rita Queiroz

Sérgio mostra um dos seus dois trabalhos que pintou quando ainda era jovem

Comunidade tranquila

Atentos os alunos recebem as primeiras instruções antes de por a mão na massa

 O convite pegou a artista de surpresa e mais surpresos ainda ficaram os alunos, ao verem que a professora era ninguém menos que a pintora Rita Queiroz, com fama internacional  e que estava disposta  a ensinar como se inicia a pintura de uma tela em um bairro de periferia. “No começo eu estava até preocupada em como seria o trabalho, mas quando cheguei lá vi que todos estavam muito entusiasmados, fiquei tranquila.  Em poucos dias eles  produziram não uma, mas até três telas e boa parte delas com muita qualidade”, comemorou a professora. 
Realizar trabalhos sociais é uma das coisas que a artista Rita Queiroz mais gosta de fazer, ela lembrando de atuações  com menores infratores; presos do sistema prisional de Porto Velho  e de Guajará-Mirim; idosos; internos da psiquiatria do Hospital de Base,  entre outros. “Este tipo de atividade me põe pra cima, renova a minha vida”, declarou.
 A artista plástica está com 83 anos e chegou a ser  incentivada  a   não aceitar 
 a  missão, mas disse que  valeu muito a pena ter dito sim e está disposta a retornar à comunidade para desenvolver um novo trabalho, se possível  com as crianças e adolescentes. “Me disseram que o lugar é perigoso, mas não vi isso não, pelo contrário vi as pessoas vivendo harmoniosamente, crianças brincando no pátio do condomínio e uma turminha interessada em aprender uma atividade nova na vida, isso sim, porque tirando uma ou duas pessoas, as demais nunca tinham tido uma experiência com nenhum tipo de pintura.”  

Hoje alérgica a uma das principais matéria-prima, Rita precisa usar máscara para se proteger

De Rita para Rita o orgulho em ser aluna da xará
 Até então conhecida pelos alunos apenas pelo nome, Rita descobriu que tem muitos admiradores de sua arte, como a xará Rita Pereira Lima, uma cozinheira aposentada  de 67 que disse estar muito  honrada em conhecer a artista mais famosa de Porto Velho. O contador Sérgio de 35 anos precisou correr para chegar a tempo às aulas. Ele contou que sempre foi interessado pelas artes plásticas e chegou a produzir duas telas, mas teve que abandonar a arte por falta de recursos e por ter que se dedicar a vida profissional, mas que agora encontrou um novo alento e que pretende dar continuidade. "Aqui tem pessoas muito talentosas", afirma a artista. 
Instrução personalizada
Além da costura e do crochê Sueli descobriu mais um talento
  Sueli de Abreu trabalha com costura e com crochê, tem 61 anos e disse que quando soube do curso pensou consigo mesma “Sueli, tá ai uma boa oportunidade pra você aprender o que ainda não sabe”. A reflexão foi levada a sério. No dia de começar o curso foi a primeira a chegar e estava ansiosa pelo que iria acontecer ao longo da semana e destacando que o certificado da oficina de pintura,  assinado por Rita Queiroz,  teria um lugar de destaque na sala. "Valeu muito a pena estar aqui, porque as orientações recebidas da professora Rita foram muito valiosas", salientou Sérgio.


Rita não descarta a realização de um novo trabalho no local, desta vez voltado para as crianças
O Projeto  de Trabalho Social (PTS) tem como uma de suas funções organizar atividades sociais e ambientais  para as famílias beneficiadas pelo programa  Minha Casa Minha Vida, cujo principal objetivo é oferecer moradias para as famílias, em geral de baixa renda. E neste contexto estão incluídas ações culturais, como a realização de uma oficina de pintura em tela, como registrado no Residencial Porto Belo II.

Segundo os organizadores, a princípio as vagas seriam destinadas aos idosos e portadores de necessidades especiais, mas para fechar a turma, o acesso foi estendido a outros interessados. Com isso aumentou a procura e quem não acelerou ficou de fora.
Geovani foi direto ao coração da professora ao inspirar-se em uma coruja para pintar, a ave mais admirada Por Rita
Mas nem só de adultos foi formada a turma de alunos de Rita Queiroz. Vitória, uma adolescente  de 14 anos no primeiro dia disse que não sabia pintar nada, mas que sempre gostou de admirar  paisagens e apostou no manuseio das tintas e pinceis. Geovani de 13,  foi o primeiro adolescente a se apresentar, ele inclusive levou os desenhos de carros criados por ele mesmo para mostrar a professora. Seu trabalho final foi uma coruja, que deixou Rita encantada pela admiração que tem por esta ave.  Gustavo de 11 anos foi o  caçulinha da turma. Chegou já no segundo dia, mas tomou posse como os primeiros,  e empolgado exibia sua camisa marcada pelas cores das tintas usadas para a produção do seu trabalho, se portando como um grande artista. 


A oficina de Pintura foi realizada no período de 09 a 13/12/2019 no Residencial Porto Belo II – Bairro Socialista