segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

INTERCÂMBIO CULTURAL TEM LIMITE DE IDADE?

 Ayub, do Iémen,  completou 18 anos longe de casa fazendo seu primeiro intercâmbio

Árabes, japoneses, iemenitas, brasileiros, angolanos e sul-africanos variedade de culturas. Ayub, o nono na foto, é nosso caçula. Com a pasta azul é  a teacher Portia Lesch. 
Até quando devemos estudar? Isso mesmo sentar-se em um banco escolar e aprender coisas novas. Fazer novos amigos. Será que tem uma idade limite para tal façanha?

Sempre tive vontade de aprender uma nova língua. Na juventude passei por cursos de inglês, mas nunca consegui avançar o suficiente. Há uns quatro anos voltei a carga com força, mas o resultado não foi o esperado. Este ano parti para um projeto mais agressivo e fui intercambiar. Escolhi a África do Sul porque já estivera lá e o custo benefício em muito me favoreceria. Agência contratada, escola escolhida e com todas as outras burocracias aprovadas parti.
Deixar casa, família e tudo mais para trás não é fácil, pelo menos não na primeira vez. A princípio até achava que as dificuldades seriam facilmente superadas, mas não foram. Aqui, na sala de aula falamos a mesma língua e fora, quando se está perdida em um mundo que põe você de ponta cabeça? Ai a saudade aperta, o coração grita, a tristeza avança e tudo vira um caos. Hoje somos favorecidos pela tecnologia que nos dá acesso a todo tipo de informação instantaneamente. Isso me faz pensar em como era para as pessoas em um passado não muito distante, quando a Internet e seus recursos não eram tão populares. Pois bem, o aprendizado não foi o esperado. Sofri com um bloqueio por cerca de 60 dias. Até que faltando um mês para voltar para casa a mente começou a funcionar. Ai, já era tarde e Inês, como diz o velho ditado, já estava morta, ou quase. Mas descobri que é possível, que sou capaz e vou continuar a tentar.
Aqui a turma de Reunion, um departamento francê localizado próximo de Madagascar, é a maioria, mas não pode faltar um brasileiro na classe, no caso, dois, nós estamos em todos os lugares.  Teacher Mayuri, a terceira sentada. 
Primeira turma com teacher Fatima

Uma aula no campo para descrever os monumetos de Cape Town com a teacher Hearther

Na primeira turma a gente quase sempre esquece o nome de alguém, ainda mais quando se estuda junto só uma semana

Na escola em que estudei conheci pessoas de vários países, o que foi encantador. Tinha também muitos brasileiros, aliás a África do Sul está atraindo nosso povo, não somente para estudar, mas para o turismo. Certo que a maioria dos estudantes são jovens. Moças e rapazes beneficiados pelos pais para um curso no exterior, um investimento totalmente louvável. Mas há também adultos. Homens e mulheres dispostos a um aperfeiçoamento para melhorar o desempenho profissional.
Para cada um um objetivo, um sonho e um ideal
Entre as dezenas de pessoas que conheci perguntei para algumas razões para estarem em outro país estudando, Ana Maria Rodrigues Mateus, é economista, tem 59 anos e trabalha no Ministério das Finanças em Angola. Por várias vezes visitou a África do Sul, mas somente agora resolveu fazer um curso de inglês. “Na verdade eu estou aqui fazendo um tratamento de saúde e  para melhorar meu contato com os médicos, aproveitei para estudar”, destacou a angolana, para quem “o saber não ocupa lugar”.

Ana Maria Rodrigues, economista de Angola
A brasileira Beatriz Silveira é uma bancária aposentada, tem 62 anos e há tempos investe no aprendizado do inglês. Seu objetivo é melhorar a fluência para ter mais tranquilidade nas viagens. Para Beatriz, a idade não é impedimento para o aprendizado de uma nova língua, mas ela salienta que quando se é mais jovem, a assimilação também é mais rápida. “Mas sempre é tempo de estudar e de   aprender”

Beatriz, brasileira e Cleoprata, angolana
Cleópatra dos Santos tem 38 anos, nasceu e vive em Angola, mas passou seis anos no Brasil, onde estudou Engenharia da Computação. Deixou Luanda para passar seis semanas na Cidade do Cabo. Em casa ficaram três meninos, um de nove ano,  outro de cinco e o caçula  de um aninho. Para ela foi complicado ter que deixar os filhos pequenos para passar mais de um mês fora de casa, mas admite que não poderia perder a chance, uma vez que a empresa de tecnologia na qual trabalha ofereceu a ela a oportunidade de melhor capacitação. “O aprendizado não tem idade é como no amor, o importante é ter força de vontade e superar os obstáculos”. Para Cleópatra a possibilidade de aprender uma língua estrangeira com nativos é algo que não se pode dispensar.  

Vilmar e Rafael Silva além do Intercâmbio foram conhecer o projeto Obs Pasta Kitchen, que atende moradores de rua em Cape Town
Vilmar e Rafael Silva. Pai e filho. Sucesso na Good Hope Studies nas quatro semanas que estiveram por lá. Não é muiro comum a presença de duas gerações simutanemamente na escola, mas acontece. O pai, executivo de uma empresa de agronegócio em Cuiabá e o filho, naturalmente universitário. O objetivo do primeiro: evoluir no trabalho e do segundo: se preparar para o mercado que cada dia exige mais qualificação. 


Mundo árabe na Good Hope Studies in Cape Town

Ziggi, minha homestay e a amiga Gill Smit

Momemnto histórico: primeira certificação internacional

Reta Final para conclusão do intercâmbio



quinta-feira, 27 de dezembro de 2018

ROBERTO BREGA : UM ÍCONE DAS ILUSÕES



Esta é a principal foto do Facebook de Roberto Braga, parece que publicada em 2013

Esta semana li nas redes sociais  a notícia da morte de Roberto Brega, um sonhador.  Seu corpo foi encontrado em um quarto de hotel do Centro de Porto Velho e sua morte foi dada como natural. O maior desejo de Roberto Braga: gravar um CD. E o segundo maior, talvez fosse ser agraciado pelo programa do apresentador de TV Luciano Huck, no quadro Lata Velha, onde teria seu fusca azul restaurado. Possivelmente, pela primeira vez Roberto conseguiu ser notícia de verdade e atrair a atenção do público. Os posts sobre sua morte foram compartilhados por muita gente e os comentários foram centenas. Talvez nem soubesse, mas tinha um fã clube considerável.  
Um tempo atrás, acho que há quase três anos,  fiz uma entrevista com ele lá na avenida Amazonas, no Agenor de Carvalho, próximo ao local em que ele então morava. Por algumas vezes tentei produzir um texto, mas sempre esbarrava em algumas dificuldades, a primeira delas, foi que  realmente não consegui extrair dele clareza nas informações. Às vezes me parecia um homem enigmático, mas de outras  vezes, a impressão que eu tinha é que lhe faltava  lucidez para concluir frases e pensamentos. Mas agora, diante da notícia de sua morte, retomei às escassas anotações e tento extrair delas alguma coisa que faça sentido. Por algumas vezes, tentei retomar a entrevista, mas sempre que o via em algum cruzamento, ou estava apressada ou pensava que não era um bom momento.
Mas enfim, a vida passa para todos e passou para o Roberto Brega, que na verdade se chamava  José e ao ser questionado pelo sobrenome, ele alegou que todo mundo conhecia ele pelo nome artístico, e não havia necessidade de mais informações. Adotou o nome de Roberto, porque muitos fãs diziam que a sua voz era muito parecida com a do cantor popular Roberto Carlos e o brega, certamente era por causa da linha musical que adotara.  Ainda assim disse que tinha  filhos, cinco no total e sete netos e que conversava, por telefone,  com alguns deles de vez em quando.  Sem admitir a idade exata deixou que eu sugerisse uma, falei 60 anos e ele disse que era por ai.
Brega contou então que a partir de um momento de sua vida, não definido claramente, passou a perseguir o sonho de ser cantor. Lembrou que quando tinha uns 10 ou 11 anos aprendeu a tocar violão. Com essa ideia, há alguns anos, deixou o Recife excursionando até o Amazonas. Passou por cidades como Nova Olinda do Norte e Santo Antônio do Borba. Na bagagem tinha um único CD gravado, e por onde passava pleiteava algumas cópias para vender ao público. Contou que viajou de avião e de ônibus com ar condicionado e que fazia shows ao vivo, mas aos poucos foi perdendo o que ganhava e por fim ficou sem a caixa de som e o teclado. Foi quando ouviu falar que talvez tivesse sorte em Rondônia, aonde chegou com 20 reais no bolso.
Passou por Guajará Mirim, onde pensava comprar um novo teclado,  para depois se estabelecer em Porto Velho. Saudoso, lembrava-se de ter tocado em um bar na Avenida Sete de Setembro, e outro no bairro da Balsa. A música principal de seu repertório, segundo ele mesmo, era “Mulher Vaidosa”, que o público sempre pedia bis.   Passou dois anos morando no fusca 1973, azul, o mesmo que nos últimos anos tentava, a todo custo, que fosse reformado no quadro Lata Velha, do Luciano Huck.
Quanto ao fusca, Brega relatou que enquanto não conseguia a reforma global, alguns  amigos tinham mandado para uma oficina em Porto Velho e que ele esperava em breve ter o seu carro de volta. Mas na verdade ele não tinha muita certeza sobre isso, pois se mostrava confuso quanto ao destino do antigo veículo.
A vida de Roberto Brega em nada se parecia com a do ídolo de quem ele adotou o nome. O único CD que conseguiu gravar foi uma matriz e sonhava com  a sua reprodução e distribuição em muitos pontos de vendas. Passados os anos e sem condição nenhuma de se apresentar, Brega passou a depender da caridade popular. O cartaz, anunciando seu show estava surrado, rasgado e sujo. Suas vestes  gastas também despertavam compaixão, mas ele não abandonava o estilo Roberto Brega de se vestir. Os cabelos emaranhados e a longa barba estavam incorporados ao seu estilo.  Pessoalmente, não me lembro desde quando ele estava em Porto Velho e acho que nem ele se lembrava, pois sempre que falava sobre este tema ele abordava outro assunto. Talvez haja em nossos jornais matérias informativas desse tempo, mas agora não tenho como verificar.
Bom seria se houvesse apenas este Roberto Brega, mas nossas cidades estão cheias de homens e mulheres que se perdem diariamente em sonhos, que para a maioria são inatingíveis. Alguns ficam na ilusão, outros apelam para as drogas, outros enfermam com a depressão. Cada um busca a sua válvula de escape. Brega chamou a atenção de muitos, mas poucos olharam para ele de verdade, e eu me incluo nestes muitos.  É provável que logo tenhamos outros Bregas nos semáforos de nossa cidade, aliás, acho que já temos. A maioria ainda é jovem, mas o tempo passa rápido e o fim de muitos talvez seja o de uma morte solitária em um canto qualquer. Acho que vale pensar em algo que  possamos fazer.


Estilo Roberto Brega de ser, inconfundível.