terça-feira, 9 de junho de 2020

SEM VELÓRIO E SEM CORTEJO

De Sansão e Pletilda a falta de velórios e cortejos para despedida dos mortos. A vida sem happy end.



Há um mês perdemos dois companheirinhos queridos, o Sansão e a Pletilda. Um seguido do outro com a diferença de apenas uma semana. Tive vontade de escrever sobre eles e sobre a perda, mas entendi então que seria um certo egoísmo de minha parte ocupar meus escassos leitores com assunto tão simplório, enquanto outros enfrentavam problemas muito maiores com perdas de ente queridos, homens, mulheres, jovens e crianças que deixam a saudade          eterna para  pais, avós, tios, irmãos, amigos e outros.  Mas hoje, ao deparar  carros funerários a caminho do Cemitério Santo Antônio, o famoso Tonhão, percebi que a morte está banalizada. Pessoas queridas se vão e não há quem faça um cortejo, quem lamente a sua partida, não porque as pessoas não desejem fazer isso, mas porque estão impedidas por causa da pandemia do Covid-19.
Estamos em guerra e assim, cada um recolha seus mortos. Os lamentos estão sendo feitos entre quatro paredes, como reza a lei do isolamento social. Situação triste, muito triste mesmo.                                                                Quando criança, morando em um bairro dormitório, aonde os moradores adultos só iam para dormir, porque trabalhavam em  locais distantes e pra completar tinha uma certa escassez no transporte coletivo, dificilmente morria uma pessoa no bairro. E se morresse alguém, virava um acontecimento, vinha gente de todo o lugar para dar condolências à família enlutada e aproveitava-se para rever os amigos, alguns distantes há anos. Em geral era preciso alugar um ônibus para levar tanta gente ao cemitério. Todos queriam ir, queriam a última despedida.  
Um dia desses uma amiga estava triste com a morte de um sobrinho de 18 anos em Fortaleza. A princípio, o menino morreu de Covid-19. Ao sepultamento compareceram a mãe e um outro familiar, cada um transportado por um motorista de aplicativo. Urna selada, sem pranteadores assim o moço foi enterrado. Duas semanas depois vem o resultado do exame médico atestando que a causa morte não foi o  corona. Imagina a dor da família? A saudade     dos amigos?
Fico imaginando como será nosso relacionamento com a morte pós coronavírus.

Sansão
Por Falar em Cachorros
Mas falando da Pletilda e do Sansão, eram ainda jovens, ele       cinco anos e ela quatro. Em plena pandemia do Covid-19 foram infectados com o vírus da cinomose. Um sofrimento para eles e para nós. Tivemos que apelar para a eutanásia. E pensar que poderíamos ter evitado ou amenizado tanta dor com uma simples prevenção, ou seja aplicando a vacina neles. Mas agora é tarde, não adianta mais lamentar, só guardar no peito a saudade que eles deixaram e lembrar de quanta falta eles fazem. O Sansão um manhoso inveterado. Dava umas uivadas muito loucas no quintal, especialmente à noite. Meus vizinhos me diziam que ele chorava muito quando eu viajava. Quando eu chegava era aquela festa. O Sansão  nos foi dado como premio de consolação.  Nossa amiga Benedita Nery tinha em casa dois cães, a  Dandara, uma pitbull com labrador e o Thollo, um pitbull puro. Eram ainda jovens, estavam na segunda cria.  Encantadas com a beleza de uma filhotinha acabamos recebendo-a como presente. Ainda estávamos descobrindo o nome da criaturinha quando a pobrezinha  desapareceu, escapou pela abertura inferior do portão e se foi. Era muito linda mesmo. Penso que alguém a levou. Benedita ainda tinha outro filhote e resolveu nos dá. Foi uma benção. Apesar de nosso olhar não ter sido      primeiro para ele, Sansão nos surpreendeu. Ganhou este nome porque era forte, parrudo, todo saradão, mesmo sendo um   bebê. Extremamente carinhoso. Lembro-me que no dia em que o levei para a castração, o jovem atendente do local lamentou profundamente pela sorte do cachorro e tentou até interceder para que eu não fizesse aquilo. Não deu certo, ele não conseguiu mudar minha opinião. Em casa já tínhamos uma cadela, a Evita e não daria certo a procriação. 

Pletilda
Depois veio a Pletilda, que também não foi escolhida. Um dia visitei uma pessoa doente e vi a cadela com duas filhotes. Achei bonitinhas. Dias depois a Cabiria, dona das cadelas me ligou implorando para ficar com pelo menos um dos animais, porque a proprietária do imóvel havia determinado que ele desse fim nos cachorros ou arranjasse outro lugar pra morar. Ficamos  com uma das filhotes, que recebeu o nome de Pletilda. Mais tarde, novamente acionada pela senhora que pedia socorro, conseguimos um lar para a mãe da filhotinha. Seu nome é Dandara e está muito bem obrigada, mora aqui na minha rua na casa da Selma que a aceitou de bom grado depois de saber que estava condenada a uma vida sem casa.
Pletilda era a que mais latia no quintal. Muito, muito barulhenta mesmo. Às vezes eu tinha que levantar de madrugada e mandá-la calar-se. Ela gostava de me espionar pela janela do quarto. Vira e mexe ela aparecia para dar uma olhada. Acho que para saber se estava tudo bem. Era a mais tímida e recatada de todos. Tarde da noite quando os soltava para dar uma voltinha na rua, ela era a primeira a retornar. Agora o quintal está silencioso, quase vazio, não fosse a presença da Evita e da   Meggie. Evita que era a líder, agora  está triste porque não tem mais a quem liderar.                                        
.
Meggie
 
Evita