De Sansão e Pletilda a falta de velórios e cortejos para despedida dos mortos. A vida sem happy end.
Há um mês perdemos dois
companheirinhos queridos, o Sansão e a Pletilda. Um seguido do outro com a
diferença de apenas uma semana. Tive vontade de escrever sobre eles e sobre a
perda, mas entendi então que seria um certo egoísmo de minha parte ocupar meus
escassos leitores com assunto tão simplório, enquanto outros enfrentavam
problemas muito maiores com perdas de ente queridos, homens, mulheres, jovens e
crianças que deixam a saudade
eterna para pais, avós, tios,
irmãos, amigos e outros. Mas hoje, ao
deparar carros funerários a caminho do
Cemitério Santo Antônio, o famoso Tonhão, percebi que a morte está banalizada.
Pessoas queridas se vão e não há quem faça um cortejo, quem lamente a sua
partida, não porque as pessoas não desejem fazer isso, mas porque estão impedidas
por causa da pandemia do Covid-19.
Estamos em guerra e assim, cada
um recolha seus mortos. Os lamentos estão sendo feitos entre quatro paredes, como reza a lei do isolamento social. Situação triste, muito triste mesmo. Quando criança, morando em um bairro dormitório, aonde
os moradores adultos só iam para dormir, porque trabalhavam em locais distantes e pra completar tinha uma
certa escassez no transporte coletivo, dificilmente morria uma pessoa no
bairro. E se morresse alguém, virava um acontecimento, vinha gente de todo o
lugar para dar condolências à família enlutada e aproveitava-se para rever os
amigos, alguns distantes há anos. Em geral era preciso alugar um ônibus para
levar tanta gente ao cemitério. Todos queriam ir, queriam a última despedida.
Um dia desses uma amiga estava
triste com a morte de um sobrinho de 18 anos em Fortaleza. A princípio, o
menino morreu de Covid-19. Ao sepultamento compareceram a mãe e um outro
familiar, cada um transportado por um motorista de aplicativo. Urna selada, sem
pranteadores assim o moço foi enterrado. Duas semanas depois vem o resultado do
exame médico atestando que a causa morte não foi o corona. Imagina a dor da família? A
saudade dos amigos?
Fico imaginando como será nosso
relacionamento com a morte pós coronavírus.
Sansão |
Por Falar em Cachorros
Mas falando da Pletilda e do
Sansão, eram ainda jovens, ele
cinco anos e ela quatro. Em plena pandemia do Covid-19 foram infectados
com o vírus da cinomose. Um sofrimento para eles e para nós. Tivemos que apelar
para a eutanásia. E pensar que poderíamos ter evitado ou amenizado tanta dor
com uma simples prevenção, ou seja aplicando a vacina neles. Mas agora é tarde,
não adianta mais lamentar, só guardar no peito a saudade que eles deixaram e
lembrar de quanta falta eles fazem. O Sansão um manhoso inveterado. Dava umas
uivadas muito loucas no quintal, especialmente à noite. Meus vizinhos me diziam
que ele chorava muito quando eu viajava. Quando eu chegava era aquela festa. O
Sansão nos foi dado como premio de
consolação. Nossa amiga Benedita Nery
tinha em casa dois cães, a Dandara, uma
pitbull com labrador e o Thollo, um pitbull puro. Eram ainda jovens, estavam na
segunda cria. Encantadas com a beleza de
uma filhotinha acabamos recebendo-a como presente. Ainda estávamos descobrindo
o nome da criaturinha quando a pobrezinha desapareceu, escapou pela abertura inferior do
portão e se foi. Era muito linda mesmo. Penso que alguém a levou. Benedita
ainda tinha outro filhote e resolveu nos dá. Foi uma benção. Apesar de nosso
olhar não ter sido primeiro para
ele, Sansão nos surpreendeu. Ganhou este nome porque era forte, parrudo, todo
saradão, mesmo sendo um bebê. Extremamente
carinhoso. Lembro-me que no dia em que o levei para a castração, o jovem
atendente do local lamentou profundamente pela sorte do cachorro e tentou até
interceder para que eu não fizesse aquilo. Não deu certo, ele não conseguiu
mudar minha opinião. Em casa já tínhamos uma cadela, a Evita e não daria certo
a procriação.
Pletilda |
Depois veio a Pletilda, que
também não foi escolhida. Um dia visitei uma pessoa doente e vi a cadela com
duas filhotes. Achei bonitinhas. Dias depois a Cabiria, dona das cadelas me
ligou implorando para ficar com pelo menos um dos animais, porque a
proprietária do imóvel havia determinado que ele desse fim nos cachorros ou
arranjasse outro lugar pra morar. Ficamos com uma das filhotes, que recebeu o nome de
Pletilda. Mais tarde, novamente acionada pela senhora que pedia socorro,
conseguimos um lar para a mãe da filhotinha. Seu nome é Dandara e está muito
bem obrigada, mora aqui na minha rua na casa da Selma que a aceitou de bom
grado depois de saber que estava condenada a uma vida sem casa.
Pletilda era a que mais latia no
quintal. Muito, muito barulhenta mesmo. Às vezes eu tinha que levantar de
madrugada e mandá-la calar-se. Ela gostava de me espionar pela janela do
quarto. Vira e mexe ela aparecia para dar uma olhada. Acho que para saber se
estava tudo bem. Era a mais tímida e recatada de todos. Tarde da noite quando
os soltava para dar uma voltinha na rua, ela era a primeira a retornar. Agora o
quintal está silencioso, quase vazio, não fosse a presença da Evita e da Meggie.
Evita que era a líder, agora está triste
porque não tem mais a quem liderar.
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Meggie |